Algodres [Figueira de Castelo Rodrigo, Guarda]


            Esta freguesia, tudo o indica, tem um povoamento ancestral, o que [facilmente] se comprova pelos vestígios do castro do monte de Santa Bárbara, derrubado pelos romanos, onde hoje está a capela da mesma invocação.
            Relevante é [ainda] a chamada fonte Cabeça [romana] onde, mais tarde, viriam a ser gravadas as armas reais portuguesas invertidas por castigo de Dom João I imposto a Castelo Rodrigo. Existem também diversas sepulturas antropomórficas situadas, por exemplo, em Quadrelas [1] e na Cova da Moira.
Não existem dúvidas quanto ao fato de já ser povoada no ano de 960, sendo sua donatária Dona Chamoa, sobrinha do rei de Leão, Ramiro II que, ao morrer sem descendência, a povoação foi doada à condessa Mumadona, fundadora da cidade de Guimarães.
Por bula do papa Lúcio III foi entregue à Ordem de São Julião do Pereiro [2] [3].


[1] No lugar das Quadrelas, na freguesia de Vilar de Amargo, há uma sepultura cavada num penedo, onde jaz uma moura encantada.
Um dia, dois homens encaminhavam-se para esse local, tratando a terra cultivada de cereal.
Pobres que eram, aproveitavam todos os sítios onde o centeio se pudesse desenvolver. O mais novo disse ao pai que ia tentar cavar em volta da alta rocha que ali se encontrava. Cansado de batalhar contra o duro terreno, reparou numa estreita fenda que havia no penedo. Curioso, cavou com mais afinco, para ver se descobria o que por ali estaria escondido.
Foi grande a sua surpresa quando a enxada bateu numa superfície dura. Afastou a terra e viu uma tampa. Chamou o pai e ao levantarem-na encontraram uma panela cheia de moedas de ouro. Espantados com tal descoberta, correram para casa, contando à mulher e à filha o sucedido, escondendo a panela em local seguro, jurando guardar segredo da descoberta. Alguns dias depois o rapaz começou a sentir-se mal e caiu de cama.
Chamaram o médico, mas este não foi capaz de descobrir qual o mal que afligia o moço.
Uma tarde, quando ele se encontrava sozinho em casa, apareceu-lhe uma velha, de cabelos compridos e desgrenhados, ocultando-lhe completamente o rosto que, numa voz arrastada, lhe disse que não procurasse mais riquezas junto ao penedo, pois a ousadia e cobiça podia sair-lhe cara.
Poucas noites depois, quando a família dormia a sono solto, o vulto da velha apareceu repentinamente no quarto do pai e, dirigindo-se para a cama do casal, deu-lhe duas bofetadas. O homem acordou estremunhado e perguntou à mulher qual a razão de lhe ter batido. Ela, espantada, disse não saber do que estava a falar.
Ao outro dia de manhã, quando contaram o sucedido ao filho, este pôs-se a cismar no que a velha lhe tinha dito, mas não contou nada aos pais. Tomando a refeição da manhã, pegaram nas enxadas e dirigiram-se para as Quadrelas, a trabalhar o pouco terreno que ali possuíam. Único sítio de onde tiravam sustento para a casa.
Andavam entretidos na faina de lavrar o terreno, quando do meio de umas pedras saltou uma cobra que se enroscou na garganta do arado.
Refazendo-se do susto, preparavam-se para afastar o réptil com um pau, quando repararam estupefactos que este tinha desaparecido.
Continuando a faina, o rapaz encontrou no meio de um rego um cordão com uma medalha de ouro, mostrando-o de imediato ao pai.
Este, ao ver tão valiosa peça, disse que era para a filha.
Foi então que o rapaz ouviu a voz da velha, dizendo-lhe:
- Lembra-te do que te recomendei!
Não te atrevas a dar o cordão à tua irmã. Põem-no ao pescoço da tua cadela e verás o que acontece.
O rapaz contou ao pai o que a misteriosa voz lhe tinha dito. Deixando o trabalho, regressaram a casa e seguiram o conselho da velha. Chamando a cadela, puseram-lhe o cordão ao pescoço e qual não foi o seu espanto ao verificarem que o pobre animal tinha desaparecido. Atirando com o cordão para longe, compraram um terreno com o dinheiro que tinham achado e abandonaram o local maldito, que apesar de lhes ter permitido melhorar de vida, tantas preocupações lhes tinha dado. [aqui]
[2] A Ordem de Alcântara Nasceu em territórios que viriam depois a ser de Portugal, nas ribeiras do Rio Côa (Beira Alta), como Ordem de São Julião do Pereiro, instituída por D. Henrique, Conde de Portugal, em 1093.
Depois de sua conquista aos muçulmanos, a defesa da vila de Alcântara foi outorgada à Ordem de Calatrava em 1214, mas quatro anos mais tarde renunciaram à defesa. Então Afonso IX de Leão encomendou a defesa à recentemente formada ordem dos Cavaleiros de São Julião de Pereiro em troca de certa dependência de filiação com respeito à ordem de Calatrava, daí que adotassem também a regra de Cister. A raíz do estabelecimento de sua sede central na vila recebida, o primitivo nome de "ordem de São Julião"' foi desaparecendo paulatinamente, até que em 1253 seus mestres se intitulavam “mestres da ordem de Alcântara”, ficando reduzida San Julián del Pereiro a ser uma simples comenda da ordem. [aqui]
[3] A localidade de Pereiro fica localizada no concelho de Pinhel e distrito da Guarda. Existe quem defenda que a sede da Ordem ficaria, ao invés, a pouco mais de 50 quilómetros de Ciudad Rodrigo [Salamanca, Castilla y León], entre a Reigada [Figueira de Castelo Rodrigo, Guarda] e Cinco Vilas [Idem].

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